domingo, 28 de junho de 2009

Beatles e a destruição do rock'n'roll

Texto publicado no jornal "O Estado de S.Paulo" de 27/junho/2009, no "Caderno 2"

A banda que separou corpo e mente
por Lúcia Guimarães

Assim o pesquisador Elijah Wald define a revolução dos Beatles, em livro polêmico que acaba de sair nos Estados Unidos

Nestes tempos de atenção escassa disputada em frases bombásticas, suspeito que o autor à minha frente, explicando pela enésima vez o título de seu livro, começa a se arrepender de não ter ficado apenas com o subtítulo — Uma História Alternativa da Música Popular Americana.

Apesar de os Beatles serem tema do último capítulo, é difícil não questionar o título Como Os Beatles Destruíram o Rock'n'roll.

Cáspite, Elijah Wald! Foi com a indignação de quem sempre esperava o dia 9 de outubro para despejar leite condensado sobre o bolo de aniversário de John Lennon que fiz a repórter calar a fã mirim que um dia eu fui.

O novo livro do historiador Elijah Wald despertou reações variadas, nenhum tédio. Seu argumento é que a história da música popular, e da arte em geral, é monopolizada pelo gosto de críticos.

No caso da música, a história oficial acaba relegando a notas de rodapé personagens importantes como Paul Whiteman, citado como influência por Duke Ellington e Louis Armstrong e, nos anos, 20, o mais bem sucedido band leader dos Estados Unidos.

Wald aponta dois marcos em seu livro. O abandono da performance ao vivo pelos Beatles teria consolidado a gravação como referência primordial da música. E a evolução dos Beatles, da banda que tocava música dançável com influência negra e tinha uma base de fãs adolescentes, para uma banda de "artistas". As aspas não se destinam denegrir a qualidade do som de Sgt. Pepper's Lonely Heart's Club Band.

A língua inglesa distingue artistic de arty: o segundo adjetivo sugere pretensão calculada. Wald acha que nós latinos somos abençoados com uma certa falta de puritanismo e isso faz com que "os mais intelectuais" dos compositores brasileiros criem música que não separa o corpo da mente — mas logo pede para não considerar o comentário uma simplificação da complexa tradição musical brasileira.

Como o rock'n'roll foi destruído pelos Beatles?

É uma ideia que não deve ser tomada literalmente porque o rock ainda está por aí. Até os Beatles aparecerem, a performance ao vivo era a principal parte da música. Os Beatles foram as primeiras grandes estrelas a simplesmente parar de se apresentar ao vivo e se tornaram músicos de estúdio. Isso causou duas grandes mudanças. Desde então, quando pensamos em música popular, pensamos em gravações. Quando os Beatles começaram, e falávamos de sua chegada aos Estados Unidos, pensávamos na famosa apresentação no Ed Sullivan Show e não num disco. Eles foram o último grupo musical importante a comprovar esse truísmo. Depois deles, a principal associação da música popular é com as gravações. Em segundo lugar, o contexto racial. Quando os Beatles chegaram aqui, a música americana estava no momento de maior integração racial de sua história. A música americana, como a brasileira, tinha comportado esse processo de interação entre a tradição africana e a europeia. No começo dos anos 60, pela primeira vez, havia uma interação mais igualitária entre as duas tradições. O pessoal da Motown, Ottis Redding, James Brown, eles eram programados em shows ao vivo e de TV e o público estava mais misto. De repente, acontece a invasão britânica. E a invasão simplesmente dividiu as plateias americanas entre os fãs do rock, que se tornou todo branco, e os fãs do soul, disco e hip hop, que viraram gêneros predominantemente negros.

Mas se você leva em conta que grande parte da plateia do rap era branca e suburbana...

Não desapareceu o público. É aí que faço a conexão com a gravação. Uma vez que a música popular passou a depender de gravação, era possível ser um tremendo fã de música negra sem nunca estar na presença de uma pessoa negra. Uma vez que tudo estava gravado, você ouvia o que quisesse sem estar na companhia especial de ninguém, fora do seu universo. E acho que foi um dos fatores na separação. Quando os Beatles começaram, eles tocavam gêneros negros e brancos. Depois deles, isso não foi mais necessário. Até os anos 50, todas as bandas tinham que tocar todo o espectro da música popular.

Também cresci ouvindo os Beatles mas não vivi o contexto de segregação musical que você viveu.

É verdade, mas vamos levar em conta também o fato de que o Brasil nunca fez a mesma separação. Os mais intelectuais dos grandes músicos brasileiros continuam a compor música que funciona num ambiente de dança. Os Beatles abandonaram o salão. E o rock também abandonou a dança, que ficou mais ligada a outros gêneros. Quando digo que os Beatles destruíram o rock, faço humor sobre o fato de que todos os grandes eventos acomodam ganhos e perdas. O lado vitorioso domina a narrativa e a gente para de pensar no que se perdeu. Eu não quero ser simplista, mas a ideia protestante de que a mente é virtuosa e o corpo, não, pode explicar boa parte do que estamos dizendo aqui. Quando dizem que os Beatles "elevaram" o rock, não se referem apenas à música mais inteligente, mas também à música menos física. E, para mim, este foi um grande racha.

Hoje, com o iPod, a pessoa que houve a Beyoncé pode nunca ser exposta ao Rufus Wainright e vice-versa.

Exatamente. Acabou o mainstream. Antes, não importava qual a sua preferência, era impossível evitar um repertório popular. A outra mudança é que o repertório de grandes compositores, como o Jobim, tinha interpretações variadas. Hoje, as músicas do Caetano Veloso são mais conhecidas como as músicas do Caetano, as gravações dele definem a memória do repertório. E isso é um fator importante para encolher o mercado; se uma canção existe principalmente no momento em que foi gravada e não em centenas de versões.

Um dos contrapontos históricos do seu livro é sobre como a evolução da tecnologia foi afetando formatos e gêneros. O que a tecnologia digital está fazendo com a música?

Todos têm me feito a mesma pergunta. Se há algo que você aprende, como historiador, é que a gente sempre tira conclusões erradas sobre o presente. Neste momento, eu suponho que sabemos menos sobre o estado da música popular do que em qualquer outro momento na história. A música escapuliu das grandes corporações. As vendas de discos não significam mais nada. Uma pessoa compra um CD e aí? Cem outras copiam? Ou serão mil pessoas, online? Ninguém sabe quem está comprando o que. O rádio perdeu influência, é ouvido principalmente no carro, nos Estados Unidos. As pessoas ouvem as suas playlists, não a lista da estação de rádio. Veja dois exemplos recentes que confirmam a minha ignorância. A música mexicana, poderosa nos Estados Unidos, é distribuída predominantemente por celulares. A maioria dos downloads de MP3 no país são de música mexicana, para consumidores que nem têm outro aparelho além do celular. Numa loja de discos, vejo uma seção inteira devotada a álbuns de videogames. Você compra o CD do Aerosmith como um original do jogo Rock Star. Então, quem sabe de fato o que está acontecendo? A ironia é que as corporações multinacionais continuam muito poderosas, mas os sistemas de distribuição mudaram demais. Não sei como está a audiência do YouTube comparada à audiência dos cinemas. E a tecnologia transforma todos em produtores de conteúdo. Uma coisa é certa. A música ao vivo continua perdendo terreno. É cada vez mais difícil arrancar gente de casa para ver qualquer coisa ao vivo.

Uma vez o João Bosco lembrou que a música brasileira relevante da segunda metade do século 20 repousava numa escala de sucesso comercial que hoje seria impensável. Alguns dos nossos grandes compositores não teriam nem contrato com gravadora.

Concordo, o universo dos números é outro. Mas é importante entender também o quanto as gravações adquiriram importância muito mais tarde. Até o começo dos anos 60, a maioria dos artistas ganhava dinheiro ao vivo. Os discos eram veículos promocionais. Os músicos não se ligavam tanto em royalties, até aparecerem os Beatles. Foi a outra mudança que eles trouxeram — a ideia de que podia se ganhar muito mais com as próprias composições. Os Beatles são o exemplo perfeito de uma banda que, por um momento reuniu os dois grupos de público e depois tomou outro caminho. E tomou, das adolescentes que gritavam, a música que tinham dado a elas. E não digo que isso é mau, é apenas diferente. Em nenhum momento considero que foi ruim os Beatles terem se tornado artistas. Só constato que isso removeu a música deles do lugar original.

Você critica os historiadores que consideram, por exemplo, a Sarah Vaughn legítima mas não a imensamente popular Connie Francis. O que há de errado com isto?

Não há nada errado em contar a história do que apreciamos. E é assim que a história do jazz e do rock é contada. Mas, se alguém quer entender o que aconteceu, não pode falar só do que aprecia , tem que falar do que não gosta. Os Beatles, o Elvis Presley, eles eram músicos profissionais trabalhando no mundo real. Eles gostavam de muita música que os críticos ainda detestam. Julgar a música deles pelo que combina com o gosto dos críticos é OK, mas se queremos entender a evolução da música temos de levar em conta mais do que o gosto dos críticos.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

MPB hoje: "90% é porcaria"

Texto publicado no site "globo.com", de 21/junho/2009, às 12h29m, na página de "Cultura"

Porto Musical
Nelson Motta diz que 90% da música brasileira "é porcaria"

RIO - Para Nelson Motta, 90% do que se produz na música brasileira atualmente é "porcaria" e um artista que, a essa altura do campeonato, afirma fazer MPB é, no mínimo, "corajoso".
O produtor musical, jornalista, escritor e compositor carioca deu essas declarações durante o evento Porto Musical, convenção internacional que reúne nomes dos mercados de música e tecnologia na capital pernambucana pelo quarto ano.

Em sua palestra, intitulada "Música brasileira na atualidade: o futuro da indústria fonográfica com o advento das novas tecnologias e meios de comunicação", em Recife (PE), Nelson Motta se colocou no papel de consumidor de música para questionar o volume de informações que chegam aos ouvidos das pessoas hoje, com a democratização digital em pleno curso.

"Hoje os músicos estão concorrendo com outros músicos, do mundo inteiro. O músico, quando diz pra mim que faz MPB, eu digo que ele é corajoso, pois fazer MPB depois de tudo que foi feito? Se não for para fazer melhor, é melhor não fazer", disse Motta, segundo o jornal " Diário de Pernambuco ".

"Quanto mais tecnologia eu vejo mais eu acredito no talento", disse Motta, antes de provocar a plateia: "Para ser generoso, eu acho que a música popular, 90% dela, é uma porcaria feita para jogar no lixo. Mas é preciso o lixo para termos as flores, os 10% que se integram à trilha sonora da cultura do país", afirmou Motta, para quem a eletrônica e o hip hop são as grandes modelos musicais do século XXI, a exemplo do que a canção representou para o século XX.

"A tarja eletrônica se misturou como vodka a tudo quanto foi gênero: bossa, samba, funk", disse.

sábado, 20 de junho de 2009

O eterno boêmio

Texto publicado no jornal "O Estado de S.Paulo" de 20/junho/2009, no "Caderno 2"

Os 90 anos do eterno boêmio Nelson Gonçalves
por Lauro Lisboa Garcia

DVD com um programa de tevê de 1981 e outro que vai ao ar na Cultura amanhã celebram o aniversário do cantor gaúcho

Dois programas de televisão, um de 1981 recém-lançado em DVD e outro que vai ao ar amanhã às 20h30 pela Cultura, fazem um bom apanhado da história de um dos mais populares e pungentes cantores que este país já teve: o eterno boêmio Nelson Gonçalves (1919-1998).

O motivo é de festa por sua memória: a comemoração de seus 90 anos de nascimento.

O especial "Nelson Gonçalves - 40 Anos", da TV Globo, que sai agora no DVD "Eternamente Nelson", pela Sony Music, começa com a voz em off do cantor fazendo uma síntese precisa da própria biografia: "Meu nome é Antonio Gonçalves Sobral, gaúcho de Livramento. Minha vida sempre foi uma luta; minha arma, minha voz. Meu escudo, minha mulher, Maria Luiza, meu destino: cantar."

Nos extras, entre outras histórias (algumas cômicas, outras barra-pesada) conta como foi rejeitado no início por Ary Barroso (1903-1964) em seu programa de rádio. Nelson comemorava então 40 anos de carreira, nos quais nunca faltaram parceiros fiéis, como o célebre compositor Nelson Cavaquinho (1911-1986), que o acompanha aqui ao violão em "O Dono das Calçadas", que ele diz ter feito pensando no cantor. "Como é bom a gente ser amigo, como é bom a gente ser querido", diz a letra do samba, que traduz bem o momento de Nelson, então se recuperando do vício em drogas: "Eu que já vaguei nas madrugadas e já fui o dono das calçadas/ Pra todos aqueles que me estenderam a mão/ Dividi meu coração."

Alguns de seus grandes sucessos estão presentes nos números musicais: "Negue", "Fica Comigo Esta Noite", "A Volta do Boêmio", "Escultura" e "Meu Vício É Você" — todas com a assinatura de Adelino Moreira, um dos autores mais gravados por Nelson, bem como a dupla Jair Amorim e Evaldo Gouveia (de "A Despedida" e outras).

Nelson também aparece em dueto virtual com Orlando Silva (1915-1978), a quem homenageia com Pedestal de Lágrimas, mais uma de Adelino Moreira. Com Orlando e Francisco Alves (1898-1952), Nelson formou aquela que ficou conhecida como a suprema trindade vocal masculina da era do rádio.

Ao contrário de seus contemporâneos, porém, o último remanescente do estilo de voz empostada não ficou preso ao passado.

No auge do sucesso caiu no ostracismo ao se atolar na cocaína e foi até preso por conta disso em 1963. Passado o pesadelo, porém, Nelson levantou-se lentamente e a partir da década de 1970, modernizando o repertório, gravou com diversos de seus admiradores — incluindo Maria Bethânia, Chico Buarque, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Lobão. No programa da Globo, exibido em 1981, com a voz recuperada, dividiu o microfone com as então novatas Alcione e Fafá de Belém.

"A Volta do Boêmio", sua assinatura musical, é prefixo tanto do especial da Globo, como de "Mosaicos", da Cultura, narrado por Rolando Boldrin.

Como nos outros da série, este resulta de um apanhado de imagens do acervo da emissora, com registros de Nelson em programas como "Metrópole", "Ensaio" e "Bem Brasil".

Edith Veiga, Caçulinha, Adelino Moreira, Altemar Dutra Jr. e outros lembram Nelson em depoimentos e interpretações inéditas para alguns clássicos que ele imortalizou, como "Maria Bethânia" (Capiba), "Caminhemos" (Herivelto Martins) e "Alguém me Disse" (Evaldo Gouveia/Jair Amorim).

Em quase 60 anos de carreira, ele cantou muito samba-canção, estilo romântico que o consagrou, mas também tango, bolero, toada, valsa, fado, modinha, choro e outros gêneros clássicos.

Gravou mais de 2 mil canções em 183 discos de 78 RPM, cerca de 100 compactos e 100 LPs, vendendo em torno de 53 milhões de exemplares desses registros todos.

Sem dúvida, números impressionantes. Não é pra qualquer um.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

DJs de iPods... ou personal ipodders

Texto publicado no "Jornal da Tarde", de 19/junho/2009, seção "Variedades"

Baile de um homem só
por Felipe Branco Cruz, felipe.cruz@grupoestado.com.br

DJs de iPods ganham a vida fazendo trilha sonora sob medida para clientes

A vida ganhou trilha sonora até para fila de banco desde que a música decretou sua liberdade de meios físicos nada portáteis como CDs, fitas e LPs e foi parar nos minúsculos iPods. Agora, um novo personagem ganha força nesse bailão individual: os DJs de iPods, mais conhecidos como personal ipodders. Especializados em combinar canções segundo o perfil de cada cliente, que pode ser uma pessoa ou um restaurante, essas figuras ganharam força.

Há três anos, antes de o aparelho se popularizar, os principais clientes eram ouvintes que queriam consumir música sem se digladiarem com a tecnologia. Assim, procuravam alguém que fizesse ‘o serviço sujo’ de baixar as músicas para eles. Com a popularização do tocador digital, o perfil da freguesia mudou.

Hoje, quem mais procura por um personal são restaurantes e hotéis que aproveitaram para jogar fora centenas de CDs que ocupavam espaço debaixo do balcão por apenas um iPod, capaz de armazenar até 30 dias de músicas.

Pessoas comuns também continuam requisitando seus serviços, mas agora eles buscam por novidades e por playlists personalizadas. “Meu público são as pessoas que querem sonorizar sua vida. Converso com cada um dos meus clientes, descubro seus hábitos e gostos musicais e faço a seleção”, explica Dodô.

Hugo Delgado, um dos sócios do restaurante Obá, contratou os serviços de Cris Naumovs. Com o que conheceu, compara o trabalho de um personal ipodder ao de um decorador. “A música, assim como os quadros e a decoração, não é a protagonista de um restaurante. Mas esses elementos são responsáveis por criar uma atmosfera mais agradável”, diz. Para o restaurante, a DJ de iPod Cris fez 60 playlists diferentes: 30 para o almoço e 30 para o jantar. “Assim temos músicas diferentes durante todo o mês”, diz Delgado.

Mais do que agradar aos clientes, a música ambiente evitou que o dono do restaurante parasse de se preocupar com a música e se focasse apenas na cozinha. “As vezes o CD tocava várias vezes seguidas e os garçons não aguentavam mais ouvir a mesma música”, diz. Cris conta que começou a trabalhar com isso por acaso. “Por trabalhar como DJ, me perguntaram se eu sabia mexer com iPod. Fiz para uma amiga, que recomendou a outra, e assim foi”, explica.

A mesma história conta DJ Dodô Azevedo, responsável por cunhar o termo personal ipodder. Ele chega a receber por mês até 20 pedidos de downloads personalizados. “Mas eu só pego quatro trabalhos por mês. Chego a escolher mais de mil músicas para cada cliente. Para fazer o trabalho bem feito é preciso tempo”, diz o DJ. No momento da entrevista, ele estava comprando músicas nigerianas em um site para um freguês.

Dodô também é autor do livro DJ Pessoal - Uma Áudio Ajuda, uma espécie de manual do personal ipodder. “No livro, ensino como fazer bons playlists e dou sugestões de músicas essenciais para se ouvir quando estiver com gripe, quando levar um pé na bunda ou para malhar.”

O DJ destaca também que todas as músicas são compradas legalmente em sites como iTunes e Uol Store. “Um personal stylist vai com você até a loja, diz quais roupas você deve comprar. Ele ganha 25% em cima do que você gastar. É a mesma coisa comigo. Digo quais músicas a pessoa deve comprar e cobro 25% em cima do valor da compra.” Se o mês for muito bom, o DJ chega a ganhar até R$8 mil.

Dodô diferencia seu trabalho do de um mero técnico em informática. “Se um ricaço me pede para transformar todos seus CDs em MP3, esse não é um trabalho de ipodder e sim de um técnico em informática.” Entre as pessoas que já contrataram os serviços de Dodô, estão o técnico de basquete Bernadinho e a atleta Fernanda Venturini, além de Ana Paula Araújo e Astrid Fontenelle.

O DJ Rafa Nunes se mudou para a França há dois anos. Por lá as coisas são mais complicadas e não existe este mercado. “Aqui na França as pessoas baixam gratuitamente podcasts com programas de rádios.” No Brasil, ele adicionava nos iPods de seus clientes remix de canções que discotecava a noite. “Antes, eu vendia CDs e DVDs. Depois, passei a vender os MP3 direto nos iPods.”

MÚSICA E GRIPE

Dodô Azevedo, autor do livro DJ Pessoal - Uma Audio Ajuda, aproveita o inverno e sugere uma lista com as melhores músicas para se ouvir enquanto estiver resfriado.

‘Becha By Goly, Wow’ - The Stylistcs. “Delicioso groove Motown com vocais em falsetes curativos enviados do céu.”

‘Hands of Time’ - Groove Armada. “Chega junto discreto como um gato que se ajeita no pé.”

‘Shaolim Satellite’ - Thievery Corporation. “Limão e gripe, tudo a ver.”

‘Liebestraum No. 3 em Lá, Op. 62, S. 541 - Claudio Arau.“Essa peça de Lizt ao piano de Claudio Arau é um paracetamol definitivo.”

‘Breathe Me’ - Siá. “A voz sussurrada é Vaporub espalhado no peito pela mãe.”

’Só quero um Xodó’ - Gilberto Gil. “Uma das vantagens em ficar gripado é poder fazer-se de vítima.”

‘Silk Road’ - Yu Xiao Guang. “Música de acupuntura.”

‘It never entered in my mind’ - Miles Davis Quintet “jazz, música curativa.”

A pedido do ‘JT’, o DJ e personal ipodder Dodô Azevedo conta como fazer para montar um playlist pessoal perfeito.

Não tenha medo de novidades.

Novas músicas surgem todos os dias. Algumas são boas, outras nem tanto.

Um dos segredos para uma boa trilha sonora é trabalhar com sua memória afetiva. Descubra qual música traz para sua mente boas recordações.

Como montar uma trilha para o outro ouvir

Para o amigo, a namorada ou quem sabe até um futuro cliente, Dodô dá as dicas para montar trilha dos outros.

A maioria das pessoas gosta de músicas comuns. Mas isso não quer dizer que a música tenha de cair no lugar comum.

O ideal é ter bom humor. Não é brega, por exemplo, escolher 'Sandra Rosa Madalena', do Sidney Magal, se for feito com criatividade.

Com a namorada, o segredo é a ‘fofura’. E o bom humor anda muito próximo da ‘fofura’. Para entender o que é essa tal de ‘fofura’, basta ouvir a trilha sonora do filme ‘Juno’.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Goodbye, Virgin Megastore! - parte 2

Texto publicado no portal do jornal "O Globo" de 15/junho/2009 às 12h05m
— ver texto anterior "Goodbye, Virgin Megastore" em 04/março/2009



"DINOSSAURO"
Última loja da Virgin nos Estados Unidos fecha as portas

RIO - Caiu, no domingo [14/junho/2009], mais um símbolo da combalida indústria musical. Incapaz de concorrer com a crise econômica e os novos suportes digitais, a gigantesca Virgin Megastore da Union Square, loja-referência da cadeia de venda de discos, fechou definitivamente as portas.

Esta e uma pequena loja em Hollywood eram as últimas remanescentes da outrora poderosa rede ainda ativas. Em seu último dia, os descontos nos produtos chegaram a 90 por cento.

"Infelizmente, as grandes lojas de varejo de música viraram um dinossauro", lamentou, ao jornal "The New York Times", o ex-empregado da Virgin Tony Beliech, de 39 anos, com um punhado de CDs nas mãos que, somados, custaram-lhe menos de US$ 20. "Mas isso aqui funcionava também como um ponto de encontro social, algo que a compra de música pela internet não pode oferecer".

A Virgin segue o mesmo caminho de outras redes de varejo, como a britânica HMV (que encerrou atividades no país em 2004) e a Tower Records (que fechou suas 89 lojas nos Estados Unidos em 2006).

Para o analista financeiro Michael McGuire, "o 'Titanic' que são os suportes físicos começou a afundar lentamente em 2000, algo traumático para os empregados neste negócio, mas previsível dentro desta transição para o modelo digital".

De acordo com a empresa de consultoria Nielsen SoundScan, desde 2000, quando 785 milhões de unidades foram vendidas, a indústria amarga uma queda de 45% nas vendas de discos.

Dezenas de lojas independentes, porém, resistem em Nova York e, de acordo com a Almighty Institute of Music Retail, uma companhia de pesquisa de mercado, há cerca de 2 mil estabelecimentos do tipo nos Estados Unidos. Mas quem irá comprar nelas?

Max Redinger, de 14 anos, passeava com seu cão na frente da Virgin moribunda no domingo e acabou comprando alguns bonecos do game 'Guitar hero', além de livros de 'anime'.

Ao "New York Times", Redinger contou que compra músicas pelo iTunes e mencionou que um amigo o levou recentemente a uma loja de música "física". "Era um lugar bem legal, mas realmente não vou comprar nada lá".

A Virgin ainda mantém lojas abertas na Europa e no Oriente Médio.

sábado, 13 de junho de 2009

"O Futuro da Música Depois da Morte do CD"

Texto publicado no site "estadao.com.br" em 26/maio/2009, no blog de João Luiz Sampaio ("Música clássica... e um pouco de tudo")

O futuro da música
por João Luiz Sampaio

“Fala-se muito no crescimento das vendas de música digital; porém, o que parece estar em questão, aqui, é menos o CD como suporte físico do que sua condição de protagonista e sujeito único da difusão de música no planeta. É nesse sentido que nos soa legítimo falar na morte do CD. Porque talvez não estejamos simplesmente diante de mais um período de substituição de formatos, em que o CD, depois de tomar a primazia do vinil, estaria cedendo seu lugar ao, digamos, MP3. O cenário atual parece consideravelmente mais complexo, colocando em xeque o próprio paradigma de circulação global de bens culturais.”

O trecho acima foi retirado da introdução de Irineu Franco Perpetuo para “O Futuro da Música Depois da Morte do CD”, que ele organizou ao lado de Sergio Amadeu da Silveira. É um livro primoroso. Parte do princípio que a morte do CD nos leva além da discussão de formatos, redefine toda a distribuição – e, mais do que isso, a própria dinâmica da criação musical. O pianista Eduardo Monteiro, por exemplo, fala do impacto das novas tecnologias sobre o estudo do piano – e o tipo de pianista que começa a ser formado. A relação estreita entre criação musical e avanço tecnológico é tema do compositor Harry Crowl, que em seu texto faz um panorama histórico dessa relação, tocando, inclusive, na questão dos direitos do autor na era da internet. E por aí vai, com textos do próprio Sergio Amadeu, de André Mehmari, Penna Schmidt, Ricardo Bernardes, Chico Pinheiro e por aí vai. Em resumo: é um livro que pega um tema bastante atual e o aborda fugindo do óbvio, com texto de gente que vive a música e analisa os impactos da tecnologia no dia a dia, capazes de demonstrar experiências próprias e ir mais além em suas discussões. Detalhe importante: o livro está disponível gratuitamente na internet, no site http://www.futurodamusica.com.br/

domingo, 7 de junho de 2009

No mundo das aparências, uma surpresa - parte 2

Texto publicado no jornal "Folha de S.Paulo" de 7/junho/2009, no caderno "Ilustrada" (ver parte 1 no post de 21/abril/2009)

Susan Boyle e o efeito Patinho Feio
por Bia Abramo

Na máquina da hiperexposição, Susan Boyle derrotada vale mais do que vencedora

DUROU SEIS semanas, uma eternidade em termos de tempo-internet.

Essa foi a janela oferecida a Susan Boyle, a escocesa pé-no-chão depois de sua apresentação incrível no "Britain's Got Talent".

Incrível, no sentido de difícil de acreditar, é mesmo a palavra para a primeira aparição de Susan, no longínquo mês de abril deste ano. Os olhares e esgares de incredulidade de todos, jurados e público, quando ela apareceu pela primeira vez no palco não precisam de muita sociologia para explicar. Já dizia tudo: como ela poderia ousar?

É claro que todo mundo adorou se sentir magnânimo ao trocar a incredulidade pela admiração quando ela apareceu cantando "I Dreamed a Dream" no YouTube. A gente nem precisou mesmo manifestar o desagrado, o incômodo — as caras dos jurados e os risos da plateia fizeram isso por nós. É claro que muitos se sentiram aliviados ao ouvir como ela cantava, com paixão e beleza, com afinação e vontade.

Ficamos todos encantados com o contraste entre sua vida apagada e sua coragem de enfrentar um programa de televisão competitivo, em que um e apenas um se sai vencedor (apesar de toda a conversa de que o importante é participar). Conhecemos a capacidade devastadora dos julgamentos de Simon Cowell e, bem, se ele, o sujeito que ganha dinheiro para ser livremente sarcástico, simplesmente "adora" Susan, como ele declarou ao comentar sua performance, quem somos nós para também não adorá-la?

Mas ela não ia mesmo ganhar, ia? Alguém achou que Susan Boyle, mesmo cantando daquele jeito, mesmo possibilitando que milhões de pessoas no mundo inteiro se sentissem bem por acreditar em alguém incrível, seria a vencedora de "Britain's Got Talent"?

Na máquina de moer carne da hiperexposição, ela já teria ido longe demais. Começou a dar defeito — dias antes da final, teria agredido verbalmente repórteres do "The Sun". O efeito Patinho Feio não ia durar para sempre. Mesmo com todo o sucesso, não seria tão marquetável como seus outros concorrentes — um simpático grupo de street dance com o nome mais politicamente correto possível, Diversity, adolescentes talentosos e crianças mais ou menos prodigiosas.

E, claro, derrotada, ela é um prato mais substancioso para voragem da mídia — ainda por cima para o apetite dos terríveis tabloides ingleses.

Na letra da canção que a consagrou, há tigres que vem com a noite e transformam os sonhos em vergonha. Na história real, eles vem a qualquer momento.