quinta-feira, 23 de abril de 2009

Novas cantoras e o "marketing estratégico"

Texto publicado no jornal "O Estado de S.Paulo" de 22/abril/2009, no "Caderno2"

Aydar fica mais próxima de seus pares
por Lauro Lisboa Garcia

No segundo álbum, "Peixes Pássaros Pessoas", cantora aprimora o canto, mas oscila na escolha do repertório, que privilegia o samba e composições de Duani

Quando lançou o primeiro álbum — "Kavita 1" (2006) —, Mariana Aydar teve de enfrentar suspeitas de favorecimentos na mídia pelo fato de ser filha dos famosos Bia Aydar e Mário Manga. Com regravações de material antigo, o CD não fez diferença no mar de novas cantoras sem sal que morrem na praia.

No segundo, "Peixes Pássaros Pessoas" (Universal), Mariana mudou, gravando material inédito de seus pares e contemporâneos, meio na onda do sambinha de isopor, tipo Maria Rita.

Encontrou seu caminho, mas persiste um certo marketing estratégico em torno dela — ou seja, o velho esquemão de gravadora a forçar a barra.

Caetano Veloso escreveu o press release, Zeca Pagodinho participa de uma faixa, "O Samba me Persegue", Kassin, referência de bacanas, assina a produção com Duani, namorado da cantora.
Até aí, nada demais, se o disco fosse algo sensacional a justificar o hype. Não é.

Caetano fala no texto sobre certa implicância da crítica com essas cantoras sedosas que resolveram mexer os pezinhos no terreiro do samba. O problema, porém, não é o gênero, é o que se extrai dele e como se faz.

Bom de samba é Rodrigo Campos, coautor de "Beleza", com Luísa Maita, gravada por Mariana. Mas Duani, que predomina no CD, não é do mesmo quilate. O samba que ele persegue é feito de clichês melódicos, meio bregas e com letras pueris. Há bons arranjos, mas nada de extraordinário.

É espantoso como o canto de Mariana evolui em canções de melhor acabamento, como "Tá?", de Carlos Rennó, Pedro Luís e Roberta Sá (leia letra no quadro), e "Peixes", do gaúcho Nenung, da banda Os The Darma Lovers. São os grandes achados do álbum, que valorizam sua voz.

Outro bom momento é "Nada Disso É Pra Você" (Rômulo Fróes/Clima). Ela própria assina como Kavita outra boa faixa, "Tudo Que Eu Trago no Bolso" (com Nuno Ramos).

Na faixa "Por Quê?", do recém-lançado CD "Tudo Que Respira Quer Comer", Carlos Careqa faz uma bem-humorada crítica ao fato de hoje todo mundo querer ser artista, o que leva a refletir sobre a questão da vaidade que se sobrepõe à aptidão.

É evidente que uns têm talento para determinadas atividades, outros não. Uns "se acham", outros se encontram em seu real valor.

Umas cantoras fazem escolhas certas, como Roberta Sá e Verônica Ferriani. Outras, cheias de si, como Ana Cañas, Marina de la Riva e Luciana Mello, parecem entender mais de pose do que de arte.

Dentre essas, Mariana pelo menos demonstra ter mais noção de equilíbrio sobre o "salto alto", mas ainda desperta dúvidas.

*****

"Tá?"
(Carlos Rennó, Pedro Luís e Roberta Sá)

Pra bom entendedor meia palavra bas-
Eu vou denunciar a sua ação nefas-
Você amarga o mar, deflora a flores-
Por onde você passa, o ar você empes-
Não tem medida a sua sanha imediatis-
Não tem limite o seu sonho consumis-
Você deixou na mata uma ferida expos-
Você descora as cores dos corais da cos-
Você aquece a Terra e enriquece à cus-
Do roubo do futuro e da beleza augus-
Mas de que vale tal riqueza? Grande bos-
Parece que de neto seu você não gos-
Você decreta morte à vida ainda em vis-
Você declara guerra à paz por mais benquis-
Não há em toda a fauna um animal tão bes-
Mas já tem gente vendo que você não pres-
Não vou dizer seu nome porque me desgas-
Pra bom entendedor meia palavra bas-
Tá?

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