Texto publicado no jornal "Folha de S.Paulo" de 30/setembro/2009, no caderno "Ilustrada"
CONEXÃO POP
Piratear ou não piratear?
por Thiago Ney, da Reportagem Local
Gente como Fred Zero Quatro e Lily Allen são um refresco dentro dos debates de cultura pop. Porque, diferentemente da maioria dos artistas, não se apegam ao oba-oba, tentam fugir do discurso fácil, raso, cômodo, do senso comum que impera nos discursos envolvendo música e internet.
Duas semanas atrás, em entrevista à Folha, Zero Quatro criticou o que chama de "fundamentalismo tecnológico": a aceitação universal de que a pirataria deve ser aceita e que é inútil lutar contra.
Dias antes, Peter Mandelson, ministro de Negócios do Reino Unido, anunciou plano de desconectar -sem a necessidade de processo judicial- usuários acusados de fazer download ilegal de arquivos (de música, games, filmes etc.).
Como reação a Mandelson, artistas como Radiohead, Robbie Williams, Billy Bragg criou o Featured Artist Coalition, grupo que apoia a troca de arquivos sem autorização.
Lily Allen, então, iniciou uma campanha em que ataca a pirataria, dizendo que o download ilegal é prejudicial principalmente aos novos artistas. Ela foi apoiada por Elton John e James Blunt.
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Não concordo com muitos dos argumentos de Zero Quatro e de Lily Allen, mas eles são corajosos de permanecer distantes de uma maioria que se baseia em falácias e em ações hipócritas.
Falácias como as de Chris Anderson, cuja "teoria" da cauda longa (muitos se manterão vendendo pouco) já foi desmantelada e que lança um livro, "Free - O Futuro dos Preços", em que enaltece a economia gratuita -gratuita para os outros, claro, pois as 88 páginas de "Free" custam, no Brasil, R$ 59,90.
E ações hipócritas como a do Radiohead, que enriqueceu dentro do esquemão das gravadoras e que depois, para ganhar uns trocados em cima dos fãs que fariam de qualquer jeito o download do disco, lançou "In Rainbows" no formato "pague quanto quiser" (ou seja: em vez de não receber nada com o inevitável vazamento do álbum na internet, a banda ganhou bom dinheiro maquiando o lançamento digital do disco).
Mas Zero Quatro e Lily Allen esquecem diversos fatos. No Brasil, pouquíssimos artistas ganhavam dinheiro com disco. Artistas médios e pequenos conseguiam, no máximo, pagar as contas com a venda de CDs; o grosso da receita vinha de shows e de publicidade.
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Outro ponto. Faz-se o download ilegal hoje porque a indústria do entretenimento ainda não conseguiu acompanhar o desejo e a necessidade dos consumidores.
É inexplicável sermos obrigados, no Brasil, a esperar meses para assistirmos a uma série de televisão, ou de não termos a possibilidade de baixarmos, por um preço justo, o novo álbum de artistas gringos.
Se o preço for justo, e a oferta, variada, continuaremos pagando.
thiago.ney@uol.com.br
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