Texto publicado no site "globo.com" de 15/maio/2009 às 08h30m, tradução de "The New York Times"
Vale-tudo
Músicas-bônus estão se tornando uma nova e controvertida regra na indústria
RIO - Se você quiser comprar o novo álbum da Dave Matthews Band, em junho, terá algumas escolhas a fazer. Há o CD normal, com 13 faixas. Há a versão "deluxe", que inclui um documentário em DVD, e também uma caixa "super deluxe": por 60 dólares (cerca de R$ 126), você leva para casa quatro canções extras, um livro de fotos de 40 páginas, 14 litografias de Matthews e um tributo de 24 páginas a LeRoi Moore, o saxofonista da banda morto em 2008. Se você comprar pelo site do grupo, http://www.davematthewsband.com/ , cada CD vem ainda com um disco ao vivo adicional. E o iTunes está vendendo a versão "simples" por 10 dólares e outra, por 20 dólares, que inclui ainda mais canções e vídeos-bônus.
No dia 1º de junho, a Dave Matthews band vai fazer um show no Beacon Theatre, em Nova York, que será transmitido em alta definição pelo Fuse, um canal a cabo pertencente à empresa promotora do concerto, a Madison Square Garden Entertainment (com 2,8 mil lugares, o Beacon é uma fração do tamanho dos lugares onde a banda normalmente se apresenta, e a renda irá para a caridade).
Assim como a indústria se adapta às mudanças do mercado, o álbum não é mais simplesmente uma discreta coleção de canções, mas um pacote que muda de tamanho, formato e preço, dependendo de como é vendido. E a promoção, que já foi simplesmente um processo de fazer um vídeo e visitar estações de rádio, está se transformando num labirinto de ações exclusivas feitas em parceria com grandes empresas de varejo e mídia — da Amazon e iTunes à Rhapsody e Wal-Mart — todas ávidas para se associarem aos grandes talentos.
Com as vendas de música em queda, as gravadoras estão felizes com os novos arranjos comerciais; muitos dos atuais contratos de gravação agora estipulam que os artistas devem entregar músicas adicionais para promoção de seus novos álbuns. Mas os músicos e seus empresários não estão assim tão dispostos a concordar com isso. Alguns reclamam de sofrerem intimidação de varejistas poderosos, bem como de seus próprios selos, para que encham seus discos com material secundário, muitas vezes inferior.
— Você tem um álbum de 12 músicas, e aí de repente precisa de mais duas para o Target, outras duas para o Wal-Mart, e mais algumas para o Best Buy — diz Jim Guerinot, que empresaria os grupos No Doubt e Nine Inch Nails. — Você acabou de gravar e está começando a planejar o lançamento, e eles só querem saber quando você vai gravar de novo — reclama ele.
Jay Marciano, presidente do Madison Square Garden Entertainment, diz que acordos como o que sua companhia fez com a Dave Matthews Band são interessantes para os artistas porque ajudam a equilibrar as perdas nos orçamentos das grandes gravadoras. Desde 2000, as vendas de discos caíram 45 por cento, de acordo com a empresa de consultoria Nielsen SoundScan.
— Os artistas não podem mais depender das gravadoras para executar suas estratégias de lançamento — diz Marciano. — Eles têm que enxergar além. Mas em muitos casos as próprias gravadoras são as intermediárias desses novos negócios, que modificam a noção de exclusividade. Para seu álbum "21st century breakdown", que será lançado pelo selo Reprise nesta sexta-feira, o Green Day está vendendo duas versões no iTunes: uma tem duas canções extras, e ambas vêm com outras duas músicas-bônus para as compras antecipadas.
O Rhapsody, outro serviço de download, tem sua própria coleção de músicas complementares da banda. Verizon Wireless, Comcast e MySpace também oferecem vídeos exclusivos de apresentações recentes do Green Day em Nova York e Oakland. Ed Ruth, diretor de conteúdo digital e programação da Verizon, diz que a busca por exclusividade é estimulada pelas empresas competidoras.
Nostalgicamente, a estratégia de oferecer extras traz de volta o velho lado B. Executivos, empresários e grandes varejistas dizem que isso tem se tornado mais urgente com a ascensão dos serviços online e o desaparecimento das grandes cadeias de discos, como a Virgin Megastore, que fechará sua última loja nos Estados Unidos no próximo verão. Vendedores online como Amazon.com e iTunes, bem como as grandes redes de varejo, como Best Buy e Wal-Mart, competem para vender conteúdo de entretenimento que os fãs não poderão encontrar em nenhum outro lugar. E quando elas conseguem este conteúdo exclusivo, passam a promovê-lo agressivamente.
Mike Bair, presidente da MSG Media, que opera o Fuse, espera fazer arranjos como o que fez com a Dave Matthews Band uma vez por mês. Ele diz que ainda há a opção de compartilhar com os artistas e gravadoras parte da receita dos negócios obtidas com patrocínio.
— Os shows se tornaram apenas uma engrenagem numa estratégia de promoção muito maior. Estamos ajudando Dave Matthews a vender ingressos, mas estamos oferecendo muito mais — diz Bair.
Entretanto, nem todos os artistas estão dispostos a dar os braços alegremente a um varejista ou a uma TV a cabo. Embora poucos artistas ou empresários venham a público se queixar, por medo de retaliações, muitos dizem que os "pedidos" dos varejistas por conteúdo são demandas efetivas, e que a recusa a cumpri-las pode resultar num freio na promoção de seus albuns. Empresários e alguns selos também argumentam que um disco feito para proveito de uma empresa pode comprometê-lo artisticamente, quebrar sua unidade como produto criativo e incluir nele material secundário.
— Quanto mais conteúdo de um artista você torna disponível, menos interessante ele se torna — diz Jeff Antebi, da Waxploitation Artists, que empresaria Gnarls Barkley e Danger Mouse.
Um representante da Wal-Mart negou que a rede exija conteúdo exclusivo para "apresentar" um álbum. Porta-vozes da Apple e Best Buy não quiseram comentar o assunto.
Recentemente, os Beastie Boys liberaram algumas músicas inéditas sem nenhum anúncio. A banda escondeu um single de sete polegadas com duas novas músicas em cópias aleatórias da versão em vinil do relançamento do álbum "Check your head", de 1992. Quando os fãs começaram a encontrar os discos, blogs de música compararam a estratégia aos bilhetes dourados de "A fantástica fábrica de chocolate".
— Nossa filosofia é que, se temos que promover algo, devemos encontrar uma forma de nos divertir com isso - disse o beastie boy Adam Yauch. - Mas quando você tem que fazer isso para 20 lugares diferentes, perde a sua força.
sexta-feira, 15 de maio de 2009
sábado, 9 de maio de 2009
Os 80 anos de um artista seminal
Texto publicado no jornal "Folha de S.Paulo" de 09/maio/2009, no caderno "Opinião"
Rapaz de bem
por Ruy Castro
RIO DE JANEIRO - O pianista, compositor e cantor Johnny Alf fará 80 anos no dia 19 próximo. Se todos os artistas que ele influenciou se dessem as mãos, a corrente humana iria de Vila Isabel, na zona norte do Rio, onde nasceu, em 1929, a Santo André, no ABC paulista, onde mora há dois anos, numa casa de repouso, desde que se submeteu a uma cirurgia e a um longo tratamento.
Exceto por alguns shows promovidos por seus fãs — Leny Andrade, Alayde Costa, Emilio Santiago, Cibele Codonho —, não se sabe de homenagens à altura da sua importância. Neste aniversário, ele mereceria um ciclo inteiro de espetáculos reunindo músicos de sua turma (ainda há muitos na praça) e das gerações mais novas, reconstruindo sua obra em vários contextos: orquestra, pequeno conjunto, piano solo, vozes, gafieira, jam session.
Os museus da Imagem e do Som do Rio e de São Paulo promoveriam palestras e debates sobre o estado de coisas na música popular quando ele apareceu ao piano de uma boate carioca em 1952 e de como, pouco depois, tivemos a bossa nova. O próprio Johnny gravaria um extenso depoimento para esses museus. Uma TV produziria um especial a seu respeito. Uma editora lançaria seu songbook. E seus discos, sempre difíceis de encontrar, seriam relançados. Mas não há nada disso programado.
Johnny não tem aposentadoria nem plano de saúde. Vive de uma pequena poupança e dos caraminguás de seus direitos autorais — e olhe que ele é o autor dos sambas "Rapaz de Bem" e "Fim de Semana em Eldorado", do baião "Céu e Mar", dos sambas-canção "O Que é Amar" e "Eu e a Brisa" e de muitos outros standards da música brasileira. Os 80 anos de Johnny começam daqui a alguns dias e levarão um ano para se completar. Ainda há tempo para homenageá-lo. De preferência, com ele ao piano.
Rapaz de bem
por Ruy Castro
RIO DE JANEIRO - O pianista, compositor e cantor Johnny Alf fará 80 anos no dia 19 próximo. Se todos os artistas que ele influenciou se dessem as mãos, a corrente humana iria de Vila Isabel, na zona norte do Rio, onde nasceu, em 1929, a Santo André, no ABC paulista, onde mora há dois anos, numa casa de repouso, desde que se submeteu a uma cirurgia e a um longo tratamento.
Exceto por alguns shows promovidos por seus fãs — Leny Andrade, Alayde Costa, Emilio Santiago, Cibele Codonho —, não se sabe de homenagens à altura da sua importância. Neste aniversário, ele mereceria um ciclo inteiro de espetáculos reunindo músicos de sua turma (ainda há muitos na praça) e das gerações mais novas, reconstruindo sua obra em vários contextos: orquestra, pequeno conjunto, piano solo, vozes, gafieira, jam session.
Os museus da Imagem e do Som do Rio e de São Paulo promoveriam palestras e debates sobre o estado de coisas na música popular quando ele apareceu ao piano de uma boate carioca em 1952 e de como, pouco depois, tivemos a bossa nova. O próprio Johnny gravaria um extenso depoimento para esses museus. Uma TV produziria um especial a seu respeito. Uma editora lançaria seu songbook. E seus discos, sempre difíceis de encontrar, seriam relançados. Mas não há nada disso programado.
Johnny não tem aposentadoria nem plano de saúde. Vive de uma pequena poupança e dos caraminguás de seus direitos autorais — e olhe que ele é o autor dos sambas "Rapaz de Bem" e "Fim de Semana em Eldorado", do baião "Céu e Mar", dos sambas-canção "O Que é Amar" e "Eu e a Brisa" e de muitos outros standards da música brasileira. Os 80 anos de Johnny começam daqui a alguns dias e levarão um ano para se completar. Ainda há tempo para homenageá-lo. De preferência, com ele ao piano.
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